01/05/2025 strategic-culture.su  4min 🇸🇹 #276630

As mulheres da Inglaterra não têm mais pênis

Bruna Frascolla

Nos EUA de Biden, responderíamos sem pestanejar que as mulheres tinham pênis, mas nunca se sabe.

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Segundo todas as autoridades científicas da botânica, o tomate é, sem sombra de dúvida, uma fruta. Não obstante, em 1893, a Suprema Corte dos Estados Unidos deu a decisão Nix v. Heden, segundo a qual o tomate, no contexto da lei tarifária, não é uma fruta, mas um legume. Não deixa de ser uma curiosa escolha de palavras, pois a Suprema Corte não decidiu que o tomate, embora seja uma fruta, deve ser considerado um legume num dado contexto; em vez disso, decidiu que o tomate é uma fruta na lei, porque a lei é feita segundo a linguagem ordinária, que é diferente da botânica. É muito esquisita essa ideia de que a Suprema Corte legisla sobre a realidade, mas é assim que funciona no país mais poderoso do mundo, um herdeiro da Common Law inglesa.

O caso do tomate nos EUA é similar ao das mulheres na Grã-Bretanha. Em 16 de abril de 2025, diante da interpretação de uma lei relativa à igualdade de gênero, a Suprema Corte do Reino Unido  decidiu (windowtext) que mulheres são aquelas do sexo feminino, excluindo-se do conceito as "mulheres trans" que portassem documentos femininos. Desde então, feministas e conservadores britânicos comemoram a nova definição. Assim, as mulheres da Grã-Bretanha não têm mais pênis.

Essa peculiar cosmovisão, que dá direito à Suprema Corte de decidir não sobre a lei, mas sobre a realidade, faz com que nos perguntemos onde mais as mulheres têm pênis. Nos EUA de Biden, responderíamos sem pestanejar que as mulheres tinham pênis, mas nunca se sabe. Durante a sabatina em 2022, a (agora) juíza associada da Suprema Corte Ketanji Brown disse que  não sabia (windowtext) definir o que é uma mulher. Trump, por outro lado, tão logo voltou à presidência, assinou uma  Ordem Executiva (windowtext) definindo homem e mulher conforme a biologia e excluindo a ideologia de gênero, definida como a ideologia que usa a autoidentificação subjetiva como um meio legítimo de determinar quem é homem, mulher ou outra coisa. Como o governo Biden tomou suas medidas pró trans lastreando-se em decisões da Suprema Corte (que é o verdadeiro poder público dos EUA), a Ordem Executiva impôs tarefas à Advocacia Geral.

Por isso, infelizmente, não é seguro determinar que as mulheres dos EUA não têm pênis. Afinal,  como vimos no assunto racial do DEI (windowtext), a Suprema Corte deixou as ações afirmativas correrem soltas por décadas a fio, em meio a dubiedades legais, até decidir que são inconstitucionais. Trump pretende ser um presidente forte, mas suas medidas são derrubadas pelo judiciário. FDR de fato foi um presidente forte, mas, para isso, aumentou o número de ministros da Suprema Corte para poder indicar uma montanha e manter o poder público mais forte do país sob sua influência.

Essa maneira esquisita de encarar o poder e a realidade é fruto da cultura protestante. Nos cristianismos tradicionais do ocidente e do oriente, a autoridade tem um rosto: o Papa, o Patriarca de Constantinopla. O cristianismo da Reforma, por outro lado, apresentou a ideia - bastante rabínica, diga-se - de que a autoridade está no texto, não numa pessoa. E assim, malandramente, a autoridade passa a ser o intérprete do texto, que, por se colocar como um leal ao texto, não se assume como autoridade responsável. É muito grande a hipocrisia desse sistema de governo, pois todos os que nele vivem fazem as contas de quantos juízes um presidente tem a seu favor na Suprema Corte. Se gente não eleita manda no país e ainda por cima impõe coisas muito impopulares, isso não deveria ser chamado de democracia.

No Brasil, que infelizmente vive sob pesada influência dos EUA, as mulheres têm pênis desde 2023 (embora eu mesma não tenha). Por aqui o protestantismo encontrou um campo fértil de sincretismo, cheio de práticas similares à santería cubana e ao espiritismo kardecista. Assim, os ministros do Supremo vivem falando de um tal "espírito da Constituição" que eles interpretam. Após possuir o ministro, esse espírito não fuma charuto, não bebe cachaça, nem escreve as cartas dos mortos: em vez disso, sai legislando por aí. E  desde 2023 (windowtext) o espírito da Constituição decidiu que as leis brasileiras contra racismo devem punir também a homofobia e a transfobia.  Em 2018 (windowtext), o espírito da Constituição havia decidido que ninguém precisa fazer cirurgias para mudar de "gênero", pois basta a autodeclaração.

Um dia isso há de passar. Enquanto isso, só o espírito da anarquia salva o Brasil, pois até hoje não há notícias de estupradores sendo transferidos para os presídios femininos.

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